domingo, fevereiro 27, 2005

Mar adentro

Acabo de ver o filme... e é capaz de arrancar óscars, meritóriamente. Se pudesse via a tv mas vou-me levantar cedo. É interessante como, com o tema da eutanásia, toca ao de leve em $1000 000 baby. Cinematográficamente, nuestros hermanos tem uma consistência admirável...
Não podendo suportar o amor, a Igreja quis ao menos desinfectá-lo, e então fez o casamento
Charles Baudelaire
A verdade de um homem é em primeiro lugar aquilo que ele esconde
André Malraux

À minha volta, reprovava-se a mentira, mas fugia-se cuidadosamente da verdade
Simone de Beauvoir

o tempo e a vaidade

Olhamos para o tempo passado com saudade, para o presente com desprezo, e para o futuro com esperança: do passado nunca se diz mal; do presente continuamente nos queixamos, e sempre apetecemos que o futuro chegue: o passado parece-nos que não foi mais do que um instante; o presente apenas (mal) o sentimos; e julgamos que o futuro está ainda mui distante. Para dizermos bem do tempo, é necessário que ele tenha passado, e para que o desejemos é preciso considerá-lo longe. A vaidade faz-nos olhar para o tempo, que passou, com indiferença, porque já nele fica sem acção; faz-nos ver o presente com desprezo, porque nunca vive satisfeita; e faz-nos contemplar o futuro com esperança, porque sempre se funda no que há-de vir; e assim só estimamos o que já não temos; fazemos pouco caso do que possuímos; e cuidamos no que não sabemos se teremos.

Matias Aires, in 'Reflexões Sobre a Vaidade dos Homens e Carta Sobre a Fortuna'

mensagens...




É o desejo que cria o desejável e o projecto que lhe põe fim
Simone de Beauvoir

life, oh life

Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar,para atravessar o rio da vida - ninguém, excepto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem números,e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso custar-te-ia a tua própria pessoa; hipotecar-te-ias e te perderias.
Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar. Onde leva? Não perguntes, segue-o


Nietzsche

prazer

O prazer que tu esperas varia na razão inversa do tempo de o esperares. E da inquietação também. Porque quanto mais esperas e te inquietas, menos prazer ele é. Espera-o no infinito para te não inquietares. E que ele seja depois o prazer que for.
Mas o contrário também é verdadeiro.

Vergílio Ferreira, in 'Pensar'

sábado, fevereiro 26, 2005

auto estima

As pessoas só reconhecem as suas qualidades quando alguém lhas desvenda e esclarece, e só confiam nelas quando há quem, antes, tenha confiado.

O desejo de sermos adorados sucede quando nos sentimos mal-amados

A mais obstinada teimosia parece ser um atributo de auto-estima «no sítio» quando, no fundo, as pessoas só são convencidas ou teimosas quando confiam pouco no que valem para os outros.

Eduardo Sá
Notícias Magazine (DN)

quinta-feira, fevereiro 24, 2005

Clint Eastwood não pára de nos surpreender, agora com o seu último filme, no qual actua, e o qual realiza e produz... não há palavras (como vem sendo hábito) . O homem é mesmo como o vinho do Porto. Hilary Swank? no comments... acho que os òscares já estão determinados.

a $1000 000 baby

A Verdade e o Erro

A verdade contradiz a nossa natureza; o erro não. A razão disso é simples: a verdade impõe-nos o dever de reconhecer a nossa limitação, ao passo que o erro nos lisonjeia dando-nos a entender que, de uma forma ou de outra, não estamos sujeitos a limites.
Qualquer pessoa gosta do falso, do absurdo, pois ele opera pela insinuação. Mas não do verdadeiro, do que é sólido, já que este opera pela exclusão.
Para os fracos é quase sempre mais cómodo o falso, o erro.
O que é verdadeiro estimula. Nada se pode desenvolver com base no erro, porque o erro limita-se a envolver-nos no erro.
É muito mais fácil verificar o erro do que encontrar a verdade. O erro está à superfície, e com isso podemos nós bem. A verdade repousa nas profundidades, e não é qualquer um que se pode lançar à investigação nessas regiões.

Goethe, in 'Máximas e Reflexões'

Apto e Inapto, Verdade e Mentira

A duração, seja os séculos para as civilizações, seja os anos e as dezenas de anos para o indivíduo, tem uma função darwiniana de eliminação do inapto. O que está apto para tudo é eterno. É apenas nisto que reside o valor daquilo a que chamamos a experiência. Mas a mentira é uma armadura com a qual o homem, muitas vezes, permite ao inapto que existe em si sobreviver aos acontecimentos que, sem essa armadura, o aniquilariam (bem como ao orgulho para sobreviver às humilhações), e esta armadura é como que segregada pelo inapto para prevenir uma situação de perigo (o orgulho, perante a humilhação, adensa a ilusão interior). Subsiste na alma uma espécie de fagocitose; tudo o que é ameaçado pelo tempo, para não morrer, segrega a mentira e, proporcionalmente, o perigo de morte. É por isso que não existe amor pela verdade sem uma admissão ilimitada da morte.

Simone Weil
, in 'A Gravidade e a Graça'

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

O Tempo Torna Tudo Irreal

O tempo, propriamente dito, não existe (excepto o presente como limite), e, no entanto, estamos submetidos a ele. É esta a nossa condição. Estamos submetidos ao que não existe. Quer se trate da duração passivamente sofrida - dor física, esperança, desgosto, remorso, medo -, quer do tempo organizado - ordem, método, necessidade -, nos dois casos, aquilo a que estamos submetidos, não existe. Estamos, realmente, presos por correntes irreais. O tempo, irreal, cobre todas as coisas e até nós mesmos, de irrealidade.

Simone Weil, in 'A Gravidade e a Graça'

terça-feira, fevereiro 22, 2005

O Dever Para Nós Próprios

Influenciar uma pessoa é dar-lhe a nossa própria alma. O indivíduo deixa de pensar com os seus próprios pensamentos ou de arder com as suas próprias paixões. As suas virtudes não lhe são naturais. Os seus pecados, se é que existe tal coisa, são tomados de empréstimo. Torna-se o eco de uma música alheia, o actor de um papel que não foi escrito para ele. O objectivo da vida é o desenvolvimento próprio, a total percepção da própria natureza, é para isso que cada um de nós vem ao mundo. Hoje em dia as pessoas têm medo de si próprias. Esqueceram o maior de todos os deveres, o dever para consigo mesmos. É verdade que são caridosas. Alimentam os esfomeados e vestem os pobres. Mas as suas próprias almas morrem de fome e estão nuas. A coragem desapareceu da nossa raça e se calhar nunca a tivemos realmente. O temor à sociedade, que é a base da moral, e o temor a Deus, que é o segredo da religião, são as duas coisas que nos governam.

Oscar Wilde, in 'O Retrato de Dorian Gray'

domingo, fevereiro 20, 2005

civilização imposta

É curioso como os homens, que tão mal sabem viver isolados, se sentem, no entanto, pesadamente oprimidos pelos sacrifícios que a civilização espera deles a fim de lhes possibilitar que vivam em comum.
(...) A civilização é coisa imposta a uma maioria recalcitrante por uma minoria que descobriu como apropriar-se dos meios de poder e coacção.

Sigmund Freud, in 'As Palavras de Freud'

sábado, fevereiro 19, 2005

memória



A memória cria-nos catálogos de medos que gerimos de forma tão desordenada quanto, ao mesmo tempo, certeira. O que hoje nos supreende devolve-nos bocados do passado afinal ainda em carne viva. Cada confronto com um qualquer horror é semelhante à sensação de ser abruptamente empurrado para trás.

Pedro Rolo Duarte

sexta-feira, fevereiro 18, 2005

A Liberdade é a Possibilidade do Isolamento

És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade do dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo. Podes ter todas as grandezas do espírito, todas da alma: és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre.
E não está contigo a tragédia, porque a tragédia de nasceres assim não é contigo, mas do Destino para si somente. Ai de ti, porém, se a opressão da vida, ela própria, te força a seres escravo. Ai de ti, se, tendo nascido liberto, capaz de te bastares e de te separares, a penúria te força a conviveres. Essa sim, é a tua tragédia, e a que trazes contigo.
Nascer liberto é a maior grandeza do homem, o que faz o ermitão humilde superior aos reis, e aos deuses mesmo, que se bastam pela força, mas não pelo desprezo dela.

Fernando Pessoa, in 'Livro do Desassossego'

Todos os Problemas se Dissiparam

(...) esta melancolia sombria, acumulada em mim por um pensamento constante, um pensamento muito acima do meu alcance: que tudo na vida não tem importância.
Sim, este pensamento ocupa-me há já muito tempo, mas a convicção completa só apareceu em mim, no ano passado. Tudo é sem importância, eis a verdade. Existirá o mundo? Ou não haverá nada em nenhuma parte? E tive a revelação de que não há nada à minha volta. Parecia-me, no entanto, que até essa altura estive rodeado por seres estranhos a mim, mas compreendi que eram aparências infrutíferas. Nada existiu, nada existe, nada existirá. Deixei logo de me irritar com os outros e de me ocupar deles. Palavra! Até chocava com os transeuntes, de tão alheado que estava. Contudo, alheado por quê? Tinha deixado de pensar. Tudo me era indiferente. Ainda se eu procurasse resolver os grandes problemas! Eu não resolvia nada, os problemas bloqueavam-me em vão; tudo se tornou para mim sem importância, e todos os problemas se dissiparam.

Fiodor Dostoievski, in 'O Sonho de um Homem Ridículo'

A Moda

As variações da sensibilidade sob a influência das modificações do meio, das necessidades, das preocupações, etc., criam um espírito público que varia de uma geração para outra e mesmo muitas vezes no espaço de uma geração. Esse espírito publico, rapidamente dilatado por contacto mental, determina o que se chama a moda. Ela é um possante factor de propagação da maior parte dos elementos da vida social, das nossas opiniões e das nossas crenças.
Não é só o vestuário que se submete às suas vontades. O teatro, a literatura, a política, a arte, as próprias idéias científicas lhe obedecem, e é por isso que certas obras apresentam um fundo de semelhança que permite falar do estilo de uma época.
Em virtude da sua acção inconsciente, submetemo-nos à moda sem que o percebamos. Os espíritos mais independentes a ela não se podem subtrair. São muito raros os artistas, os escritores que ousam produzir uma obra muito diferente das ideias do dia.

A influência da moda é tão pujante que ela obriga-nos, por vezes, a admirar coisas sem interesse e que parecerão mesmo de uma fealdade extrema, alguns anos mais tarde. O que nos impressiona numa obra de arte é muito raramente a obra em si mesma, porém a ideia que os outros formam dela, e isso explica por que o seu valor comercial sofre enormes mudanças.
Vê-se, muitas vezes, a moda impor coisas inverossímeis e manifestar-se em coisas tão abstratas e, aliás, tão ilusórias, como a criação de uma língua, a reforma da ortografia, etc.

Gustave Le Bon, in 'As Opiniões e as Crenças'

Religião Emocional

Os dirigentes das religiões bem sucedidas nunca, pode−se realmente dizer, dispensaram de todo as armas fisiológicas nas suas tentativas de conferir graça espiritual aos seus semelhantes. Jejum, castigo da carne por flagelação ou desconforto físico, regulação da respiração, revelação de mistérios terríveis, toque de tambor, danças, cantos, provocação de medo, pânico, iluminação fantástica ou gloriosa, incenso, drogas inebriantes – esses são apenas alguns dos inúmeros métodos empregados para modificar a função cerebral normal em propósitos religiosos. Algumas seitas prestam mais atenção que outras à estimulação de emoções como meio de afectar o sistema nervoso superior; mas poucas a desprezam inteiramente.

William Sargant
, in 'A Luta Pela Mente'

quinta-feira, fevereiro 17, 2005


A água vai ser racionada brevemente- a torneira deve ser girada no sentido horário de 2ª a 6ª, e no sentido anti horário nos restantes dias úteis

terça-feira, fevereiro 15, 2005


O prazer sexual (o mais forte que o ser humano sente) depende fundamentalmente das sensações tácteis, concretamente da excitação controlada de certas zonas epidérmicas que estão cobertas com os corpúsculos de Krauze, eles próprios ligados a neurónios capazes de desencadear no hipotálamo uma forte libertação de endorfinas- a este sistema simples veio sobrepor-se, no neo-córtex, graças a uma sucessão de gerações culturais, uma construção mental mais rica baseada nas fantasias e (sobretudo nas mulheres) no amor

aquela "velha bicicleta"

Relatório Kinsey...

...um filme a ver

segunda-feira, fevereiro 14, 2005

Dimensões

(quase) Todos dizemos mal da escuridão em que nos encontramos. Há velas, mais ou menos proeminentes, que corajosamente têm sido acesas (os textos de baixo, o apontam), mas o que é facto, é que continuamos como ab inicio- dizêmo-nos vitimas das circunstâncias, sempre a reivindicar mais luz...
A espécie humana acabará por desaparecer do universo (dimensão que concebe) e os seus gritos lancinantes, ecoarão ainda para lá da sua presença ingénua neste estado de coisas- o universo é agreste e a exiguidade humana atesta a disfunção da moral que inventou para lhe fazer frente.

foto google

Sociedade Cara e Primitiva

Podemos dizer sem contemplações à sociedade que aquilo a que ela chama a sua moral custa mais sacrifícios do que o que vale, e que os seus modos de proceder são falhos tanto de sinceridade como de sabedoria.
(...) Dir-se-ia que basta um grande número, que milhões de homens se encontrem reunidos, para que todas as aquisições morais dos indivíduos que os compõem se desvaneçam por completo e não restem já em seu lugar senão as atitudes psíquicas mais primitivas, mais antigas, mais brutais.

Sigmund Freud, in 'As Palavras de Freud'

sábado, fevereiro 12, 2005

morbosidades

A cabeça lateja...
O peito arqueja de dor...
O dorso lancina em reflexos nevralgicos...
Os flancos fremem cada vez que encho o peito...
Há um peso nos bronquios que desagua na garganta em dolorosos redemoinhos...
Arrepios e calafrios que me ouriçam a pele dos membros, das costas, da cabeça...

Estou em presença duma gripe... em toda a sua saudável pujança... dá-me febre, como que a lembrar-me que devia estar na cama...

sexta-feira, fevereiro 11, 2005


Vi este filme em Outubro ido... decepcionou-me um pouco, ou então fora a critica que me subira as expectativas... a elasticidade temporal, feita de sinopses e avanços até 2046, a bordo de um comboio que evoluia entre cenários de computador... "Blade Runner" foi mais sóbrio, apesar da semelhança ficar-se apenas pela coincidência futuristica. Salvou o filme o close-up feito vezes sem conta, de rostos expressivos, como que a apontar para um determinismo oriental, corporativisado por Gueixas e Meretrizes e "vassalagem" de sexo remunerado por um solitário,(num tipo de yo-yo temporal)
Porquê "2046" em fita de etiqueta Dymo?

quinta-feira, fevereiro 10, 2005

inveja


A inveja patológica demonstra o desejo de posse de algo, só existente pelo sentido de ausência, de perda,
em que o bom é projectado para o que é do outro, sendo o mau posto por inteiro no próprio. A inveja pressupõe
então um desejo de posse para a aniquilação ou destruição do que é invejado e, segundo interpretações da
psicologia clássica, pode ser lida como uma forma de expressão da pulsão de morte, uma vez que a sua existência
em larga escala não amplia, não transforma, não elabora nada da própria pessoa ou dos outros: apenas se apropria
e extingue.
Pedro Strecht in Público

foto de Marta Gonçalves

Sem Direcção

O Poder público tem sido sempre assim, quando exercido directamene pelas massas: omnipotente e efémero. O homem-massa é o homem cuja vida carece de plano e vai à deriva. Por isso não constrói nada, embora as suas possibilidades, os seus poderes, sejam enormes.

Ortega y Gasset
, in 'A Rebelião das Massas'

A vida em Comum

A vida em comum seria impossível aos homens se o interesse especial e momentâneo do indivíduo não se inclinasse ante o interesse geral e permanente de um grupo, mas o problema é obter de cada grupo político e social o que se exige do indivíduo, quer dizer, a subordinação voluntária ao interesse geral e permanente da nação ou da economia, e de cada nação o que se exige do grupo, isto é, subordinação voluntária ao interesse geral e permanente da Humanidade.

Léon Blum, in 'À Escala Humana'

Sociedade Espectaculo

A sociedade que repousa sobre a indústria moderna não é fortuitamente ou superficialmente espectacular, ela é fundamentalmente espectaculista. No espectáculo da imagem da economia reinante, o fim não é nada, o desenvolvimento é tudo. O espectáculo não quer chegar a outra coisa senão a si mesmo.
Na forma do indispensável adorno dos objectos hoje produzidos, na forma da exposição geral da racionalidade do sistema, e na forma de sector económico avançado que modela directamente uma multidão crescente de imagens-objectos, o espectáculo é a principal produção da sociedade actual.

Guy Debord, in 'A Sociedade do Espectáculo'

Fragmento do Homem

Que tempo é o nosso? Há quem diga que é um tempo a que falta amor. Convenhamos que é, pelo menos, um tempo em que tudo o que era nobre foi degradado, convertido em mercadoria. A obsessão do lucro foi transformando o homem num objecto com preço marcado. Estrangeiro a si próprio, surdo ao apelo do sangue, asfixiando a alma por todos os meios ao seu alcance, o que vem à tona é o mais abominável dos simulacros. Toda a arte moderna nos dá conta dessa catástrofe: o desencontro do homem com o homem. A sua grandeza reside nessa denúncia; a sua dignidade, em não pactuar com a mentira; a sua coragem, em arrancar máscaras e máscaras.


Eugénio de Andrade, in 'Os Afluentes do Silêncio'

O Esmagamento do EU

O espectáculo (da sociedade de consumo) que é a extinção dos limites do eu e do mundo pelo esmagamento do eu que a presença-ausência do mundo assedia, é igualmente a supressão dos limites do verdadeiro e do falso pelo recalcamento de toda a verdade vivida sob a presença real da falsidade que a organização da aparência assegura. Aquele que sofre passivamente a sua sorte quotidianamente estranha é, pois, levado a uma loucura que reage ilusoriamente a essa sorte, ao recorrer a técnicas mágicas. O reconhecimento e o consumo das mercadorias estão no centro desta pseudo-resposta a uma comunicação sem resposta. A necessidade de imitação que o consumidor sente é precisamente uma necessidade infantil, condicionada por todos os aspectos da sua despossessão fundamental.

Guy Debord, in 'A Sociedade do Espectáculo'

São duas da manhã... ou perto. O ruido surdo do computador fura-me os timpanos, tal é o silêncio em redor. Estive a confraternizar até há pouco, e se calhar é por isso que a cabeça é feita de coisa nenhuma. Fecho os olhos e atrás da córnea, dou por milhentos ecos luminosos que parecem um fogo de artificio que ilumina a pulsação do meu coração... falou-se de experiências near-death, sendo que me deram este link para consulta.... pronto, lá vem a relativização deste estado de coisas, mais uma vez...

quarta-feira, fevereiro 09, 2005


Ternura felina

Naif...?

"... a Sociedade está constituída sobre uma base injusta, que em vez de servir para o melhoramento das condições de todos, serve só para o engradecimento de alguns poucos, à custa do maior número. O princípio falso do egoísmo preside por toda a parte às relações sociais dos homens, em vez do santo princípio da fraternidade..."
Antero

MOMENTOS

EMBAIXO CINCO ELEMENTOS DA MINHA PARTICULARIDADE



Cidade onde vivi (Luanda- 1971/74)

Janela das minhas viagens

Porta da minha meninice

Rua da minha infância

terça-feira, fevereiro 08, 2005

Forma/ conteúdo


Às vezes o homem repudia a mulher, ou a mulher muda de amante, por se ter desiludido. Consequências do comportamento leviano quer de um quer do outro. Porque só é possível amar através da mulher e não a mulher. Através do poema e não o poema. Através da paisagem entrevista do alto das montanhas. E a licenciosidade nasce da angústia de não se conseguir ser. Quando uma pessoa anda com insónias, volta-se e torna-se a voltar na cama, à procura do fresco ombro do leito. Mas basta tocá-lo, para ele se tornar tépido e recusar-se. E ele procura noutro sítio uma fonte durável de frescura. Mas não consegue dar com ela, porque mal lhe toca a provisão esvai-se.
O mesmo se passa com aquele ou com aquela que se fica no vazio dos seres. Não passam de vazios os seres que não são janelas ou frestas para Deus. É por isso que, no amor vulgar, só amas o que te foge. De outra maneira, vês-te saciado e descoroçoado com a tua satisfação.

Antoine de Saint-Exupéry, in 'Cidadela'

Parecemos estar hoje animados quase exclusivamente pelo medo. Receamos até aquilo que é bom, aquilo que é saudável, aquilo que é alegre. E o que é o herói? Antes de mais, alguém que venceu os seus medos. É possível ser-se herói em qualquer campo; nunca deixamos de reconhecer um herói quando este aparece. A sua virtude singular é o facto de ele ser um só com a vida, um só consigo próprio. Tendo deixado de duvidar e de interrogar, acelera o curso e o ritmo da vida. O cobarde, par contre, procura deter o fluxo da vida. E claro que não detém nada, a menos que se detenha a si próprio. A vida continua sempre a avançar, quer nos portemos como cobardes, quer nos portemos como heróis. A vida não impõe outra disciplina - se ao menos o soubéssemos compreender! - para além de a aceitarmos tal como é. Tudo aquilo a que fechamos os olhos, tudo aquilo de que fugimos, tudo aquilo que negamos, denegrimos ou desprezamos, acaba por contribuir para nos derrotar. O que nos parece sórdido, doloroso, mau, poderá tornar-se numa fonte de beleza, alegria e força, se o enfrentarmos com largueza de espírito. Todos os momentos são momentos de ouro para os que têm a capacidade de os ver como tais. A vida é agora, são todos os momentos, mesmo que o mundo esteja cheio de morte. A morte só triunfa ao serviço da vida.

Henry Miller, in 'O Mundo do Sexo'

Muralha...


Não tenhas medo do passado. Se as pessoas te disserem que ele é irrevogável, não acredites nelas. O passado, o presente e o futuro não são mais do que um momento na perspectiva de Deus, a perspectiva na qual deveríamos tentar viver. O tempo e o espaço, a sucessão e a extensão, são meras condições acidentais do pensamento. A imaginação pode transcendê-las, e mais, numa esfera livre de existências ideais. Também as coisas são na sua essência aquilo em que decidimos torná-las. Uma coisa é segundo o modo como olhamos para ela.

Oscar Wilde, in 'De Profundis'

Freud

Civilização de Hipócritas

Existem infinitamente mais homens que aceitam a civilização como hipócritas do que homens verdadeiramente e realmente civilizados, e é lícito até perguntarmo-nos se um certo grau de hipocrisia não será necessário à manutenção e à conservação da civilização, dado o reduzido número de homens nos quais a tendência para a vida civilizada se tornou uma propriedade orgânica.


Evitar o Sofrimento

Privamo-nos para mantermos a nossa integridade, poupamos a nossa saúde, a nossa capacidade de gozar a vida, as nossas emoções, guardamo-nos para alguma coisa sem sequer sabermos o que essa coisa é. E este hábito de reprimirmos constantemente as nossas pulsões naturais é o que faz de nós seres tão refinados. Porque é que não nos embriagamos? Porque a vergonha e os transtornos das dores de cabeça fazem nascer um desprazer mais importante que o prazer da embriaguez. Porque é que não nos apaixonamos todos os meses de novo? Porque, por altura de cada separação, uma parte dos nossos corações fica desfeita. Assim, esforçamo-nos mais por evitar o sofrimento do que na busca do prazer.




Sigmund Freud, in 'As Palavras de Freud'

A beleza das coisas existe no espírito de quem as contempla
David Hume

Vacuidades

Todas as pessoas devem ter experimentado a sensação desagradável que se tem nas estações de caminho de ferro. Vamos despedir-nos de alguém. A pessoa já entrou no comboio, mas ele demora a partir. Ali ficam as duas pessoas, uma na plataforma e a outra à janela, esforçando-se por conversar, mas de repente não têm nada para dizer.
Isto, evidentemente, resulta de não podermos sentir o que queremos. A situação impõe-nos um determinado sentimento. E quem não experimentou aquele tremendo alívio quando o comboio finalmente parte?

Ou nos funerais. Quando alguém morre ou adoece, quando surgem as desilusões, espera-se sempre que sintamos determinadas coisas.
Em todas as situações, excepto as mais quotidianas, as mais neutras, há uma pressão que se exerce sobre nós, que nos dita a forma como devemos conduzir-nos, aquilo que devemos sentir, E se examinarmos bem o fenómeno, verificamos, não raras vezes, que esses papéis nos são atribuídos por romances, filmes ou peças de teatro que vimos há muito tempo.
Quando somos realmente confrontados com situações invulgares (por exemplo, rivalidades que prevíamos e não se verificam, e em vez disso se transformam num amor que nos deixa sós), a primeira coisa a que nos agarramos são esses padrões sentimentais livrescos.
Não nos ajudam muito. Deixam-nos mais sós do que antes - e caímos, desamparados, na realidade.

Lars Gustafsson, in 'A Morte de um Apicultor'

Aproveitar...

Actualmente são as pessoas que afirmam não conseguir lidar com a perda que mais facilmente se mostram ciumentas. Por oposição, aqueles que aceitam que existe sempre a possibilidade de perdermos aquilo que consideramos precioso e que sabem que tudo é efémero, tendem a tirar melhor partido daquilo que vivem no presente: valorizam a relação, minoram as dificuldades, trabalham em equipa e aprendem com os outros.

Catarina Mexia (XIS- Público)

domingo, fevereiro 06, 2005


alentejo... a melancolia, o espaço que por breves trechos afiguro a àfrica... a calma sofrida e muda do fim da planicie que não consigo abarcar... onde o sol se afunda e funde
 Posted by Hello

Nas épocas revolucionárias, aqueles que se atribuem, com tão estranho orgulho, o mérito fácil de terem provocado nos seus contemporâneos a explosão das paixões anárquicas não se apercebem de que o seu deplorável triunfo aparente se deve a uma disposição espontânea, criada pelo conjunto da situação social correspondente. Augusto Comte  Posted by Hello

sexta-feira, fevereiro 04, 2005


...Though I never knew you at all
you had the grace to hold yourself
while those around you crawled...

(sobre)vivências

o que não me tem matado, vai alimentando...

quinta-feira, fevereiro 03, 2005


wnII Posted by Hello


wn Posted by Hello
a arquitectura determina o sentido da estética, ou seja, é por ela que vejo incorporado todo o vibrar de uma época no que toca a representações de índole vária...
a estética, como determinismo do apurar de conceitos é projectada assim nas linhas do que serve de albergue, no meio desta vivência urbana, algo que raramente serve de reflexão.


adoro as formas rectas da arquitectura, pela sua simplicidade, na sua conjugação, pelos efeitos que se alcançam pelo seu paralelismo, pela perpendicularidade, pela racionalidade, funcionalismo e sobretudo pelo bom senso.
A cor... bem, a cor acaba com o equilibrio, a racionalidade, a frieza matemática- perante a cor, quando muito, podemos conjugar tons, mas a coexistencia deixa de ser pacífica entre si na medida em que a miriade de gostos individuais dispersa uma suposta unicidade, alcançada doutro modo, pela rigidez linear. Alcança-se assim como que um estado mental, na abordagem deste tema, muito similar ao estado de paixão e devaneio